segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Réquiem: Orquídea Pequenina

Para Profª Jacy (In Memorian)

James Cesar Romano

É noite. Agora despertam todas as canções daqueles que amam.
Friedrich Nietzsche

Prelúdio - E é por isso que as orquídeas cresciam.

"Orquídeas são todas as plantas que compõem a família Orchidaceae, pertencente à ordem Asparagales, uma das maiores famílias de plantas existentes." - afirma a ciência dos homens. Há mais do que isso. É preciso acuidade para observar as coisas. Há orquídeas de muitas cores, há orquídeas de muitas formas, há orquídeas de muitos tamanhos; há padrões e belezas surpreendentes, algumas (as mais raras nos surpreendem, ainda mais, pela floração ímpar: em cada ramo, surge uma família de flores, de tão belas (tão belas!), os olhos se encantam e encantam os olhos das outras, as orquídeas que, suspensas, vivem um sonho vivo de aparente eternidade. Dentre todas as orquídeas do mundo, havia uma pequenina; pequenina em tamanho, estatura; essa conheci. Os seus predicados excediam (e muito) os das muitas outras orquídeas prolixas do mesmo campo etéreo em que nascera. Esta pequenina orquídea assumiu a responsabilidade de orientar orquídeas mais jovens para que se libertassem do condicional umbral que luzia a áurea esquizofrênica da infância. Aurora. Vida em passagem, deslocação. A pequenina orquídea entoava entre todas as outras orquídeas hostis, incólume, sua tenra canção; uma canção serena e austera de amor incondicional por outras orquídeas. Cantou. Cantava. Encantou. Encantava. Nos campos, onde tudo mudava, sua canção revolvia a vida e permanecia, inspirava outras orquídeas a crescerem... e cresciam. Sua canção era antiga, como uma alma antiga, ancestral, que ainda se pode ser ouvida no silêncio da origem de todas as coisas, e é por isso as orquídeas cresciam. Sua canção de cores herdadas, de flores abstratas, suas melodias purificadas, arremetiam ao canto de cristal de anjos metafísicos intensos e suspensos. Ao longo de todo campo fenomênico, as orquídeas vicejavam ao som do canto de cristal celeste da pequenina orquídea que o reproduzia em suas melodias e canções. A cada florescência, uma a uma, e a cada flor que se tornava cantiga, a pequenina orquídea entoava e inspirava as outras orquídeas todas a crescerem e florescerem. O mistério e fim último da vida. E ela, atada à grande árvore da vida, sugava sua seiva metafísica de amor e bondade para se tornar raiz, caule e flor no imenso campo cósmico do fenômeno existencial. Não somente para si, mas para todos. Oferecia a seiva viva em forma de néctar em flor, néctar cristalino, todos que precisavam, sorviam um pouco de seu doce amor incondicional. As orquídeas bebês, as esquizoides orquídeas da infância selvagem, remota veracidade transitória e ancestral comum a todas elas; as orquídeas grandes, as orquídeas velhas, as orquídeas de todas as formas e cores que, tranquilamente, envelheciam. Sem o medo de atravessar o subjetivo umbral, quando suas flores, em movimento fatal, caíam. (Movimento inexorável do fenômeno em campo temporal de orquídeas sazonais). Todas as orquídeas saboreavam esse néctar canção cristalizado de anjos ancestrais, fonte viva de inspiração... e é por isso que as orquídeas cresciam.

Intermezzo - A pequenina orquídea sabia.

Rara orquídea pequenina, ouvia do silêncio profundo, a alma das coisas, a sua canção; e, dela, todas as coisas dançavam tranquilamente, em inocente volúpia e pureza, era a sua canção. A pequenina orquídea crescia... a cada flor-canção, mais e mais crescia; e, quanto mais crescia, mais sabia. E, quanto mais sabia, mais ensinava às outras jovens orquídeas sobre a música da vida. Não excedia em tamanho, era pequenina, seu crescimento era maior no movimento da vida e se tornava mesmo o cerne da vida, o néctar em melodia. Melodia nos olhos, grandes e profundos, olhos que veem sem enxergar, vem do olhar; melodia sorriso, dos olhos aos olhos, alimento às almas das outras orquídeas. O olhar melodia. Essa cantiga que vinha dos olhos em flor, era assim as orquídeas cresciam. É impossível florescer sem raiz; a raiz da vida, a raiz que suga seiva e a transforma em folhas, caule e flor. As raízes das orquídeas necessitam de uma raiz mais profunda, a raiz da árvore da vida. Esta, com raízes ainda mais profundas, tocam o cerne do mundo, atravessam a existência das coisas e alimentam as raízes de todas as orquídeas. Permite que todas as orquídeas vivam em seu tronco e floresçam, ofertando mais e mais vida. É dessa profundeza que vem a canção primeva, sublime e muda, fonte da melodia das flores das orquídeas. Poucas orquídeas sabiam e sabem. A pequenina orquídea sabia. Ela, mesmo pequenina, enraizou tão profundamente na árvore da vida que suas raízes de orquídea tocaram as raízes da árvore da vida. Uma se tornava a outra. E, ambas, uma. E, por sua vez, alimentava-se da seiva primeva, na profundez transcendental de um campo cósmico suspenso em silêncios poderosos que se tornavam as mais belas melodias. É no silêncio ensurdecedor que nasce e cresce a vida e, dali, surgem as mais belas cantigas. No campo suspenso da vida. E isso a pequenina orquídea sabia. Das boas seivas surgem o caule forte e, este, sustentam a vida e suas múltiplas flores; flores de luz, flores de vida... pois em tudo se torna e, assim, produz seu néctar melodia. Então toda orquídea se torna da mesma substância da árvore da vida, e isso a pequenina orquídea sabia...

Réquiem - Raízes etéreas.

É noite! Açoite-nos os olhos... açoite-os e os faça sangrar e chorar: ó, açoite temporal... soturno... noturno. É noite! É noite! Rasga o coração de carne com sua sutil mão morta de pedra. Faça doer as entranhas... faça-as doer, soluçar, agonizar a dor dos vivos e dos mortos; faça todas as orquídeas sangrarem na dor da existência, rude e árida, a terra dos tempos impuros. Açoite os olhos e os faça chorar as lágrimas do sangue gentil, pueril, dos olhos das orquídeas nascentes. Fustiga, fadigada de existência e atada ao tronco da árvore existencial de aparente vida. A canção de cristal voltou ao silêncio de onde viera, um dia. Os olhos já não se importam com a dor dos vivos, os olhos estão mortos. Olham para dentro de si, os olhos que veem e enxergam seus próprios olhos no espelho cristalino e escuro no infortúnio da noite. Há tempos as orquídeas nascem, florescem e morrem. Todas. As mais belas, as mais fortes, as maiores e as menores; todas as cores caem no abismo profundo e escuro. É noite! Nos troncos, nos campos, desde a origem, tudo madrugava e o sonhos perfeitos imperavam. Nas horas mortas, as orquídeas mortas parem sua flor trágica, flor de silêncio, flor de memórias. O dia de Vênus chegou, faz-se necessário se calar e descansar. Todas as flores caíram de seu caule existencial. Silenciaram. Silenciou-se. É no silêncio ensurdecedor que nasce e cresce a vida e, ali, jazem as mais belas cantigas. É, também, no silêncio ensurdecedor que permanece a vida e, ali, soam as mais belas cantigas. É no silêncio ensurdecedor que nasce a árvore da vida. As raízes da pequena orquídea sem vida aprofundou-se até a raiz da árvore da vida e ali permaneceu. A vida sempre está ali. Ali, a pequenina orquídea se tornou a própria vida na consciência metafísica do mundo e das orquídeas. As orquídeas jovens, as outras orquídeas que viviam na mesma árvore metafórica e feérica que a pequenina orquídea vivia, entristeceram por um momento. No entanto, logo perceberam que a pequenina orquídea ainda permanecia bem perto. Bem perto. Bastavam buscar em suas memórias a bela melodia que a pequenina orquídea cantava, a antiga onírica cantiga de suas flores-melodia. Ela estava ali, bastava que cada orquídea que a quisera bem, aprofundasse suas raízes e também tocasse as raízes da árvore da vida. No silencioso silêncio, uma flor de sonho e silêncio aflorou. Onde nasciam as perfeitas melodias, nas raízes etéreas, ali. Era ali. E ela ainda canta sua belíssima melodia sobre o dia, seus atos, sentimentos, sementes e lições de uma vida generosíssima de ensinar as outras orquídeas sobre se amarem no amor das irmãs orquídeas e valorizarem a sua tênue passagem em floração. As orquídeas têm flores frágeis. Aparecem em breve florescência, cantam, semeiam, alegram a vida e morrem. Infelizmente, algumas orquídeas perecem na primavera, como a pequenina orquídea pereceu. Encerrou todo ciclo sazonal das suas flores e partiu. Mas ela ainda permanece em nossas memórias e em nossos corações. E ainda é possível ouvir sua belíssima cantiga. Basta aprofundar-se na árvore da vida e tocar suas sempiternas raízes etéreas.






























Eternas saudades do seu amigo "Jimis", dos seus alunos e de todos da Escola Estadual Pedro Tófano Vereador.

quarta-feira, 25 de setembro de 2019

Charge: Depredação escolar

Chargista: Heloá Alves de Souza


Dom Casmurro na Escola Estadual Vereador Pedro Tófano


Pamela Martins

A peça teatral Dom Casmurro foi apresentada na Escola Pedro Tófano, no dia 18 de junho de 2019, às 20 horas, a peça fio encenada pelo ator prudentino Thiago Cardoso. O ator faz uma releitura da obra de Machado de Assis, transformando-a em um monólogo de 55 minutos de duração.

O palco foi o pátio da escola Pedro Tófano Vereador

A obra machadiana, adaptada ao teatro, já vem sendo apresentada pelo ator há alguns anos. “Dom Casmurro, num jogo de razão e emoção, o espetáculo instiga o espectador à discussão, questionamento, reflexão, análise e crítica, aproximando-o da literatura e da linguagem teatral.” - revela o ator no folder que resume sua adaptação.           

O ator Thiago Cardoso em cena

“A obra conta a história de Bento Santiago (Dom Casmurro), advogado abastado, viúvo, solitário e cinquentão circunspecto, único sobrevivente de uma história de amor com final amargo. Julga-se traído pela esposa (Capitulina ou Capitu) com o melhor amigo (Escobar), razão pela qual é um homem emocionalmente mutilado. Após vários anos da morte da esposa e do amigo, suposto amante, decide escrever a sua história para restaurar no presente o equilíbrio perdido no passado” – conforme escreve o próprio ator para o site G1 sobre suas apresentações que faz parte do projeto Teatro em Movimento – Circulação de Repertório. “Na adaptação o personagem revive a história exorcizando os fantasmas da memória e provando definitivamente perante si que não errou em abandonar a mulher e negar a paternidade do filho Ezequiel” – diz o ator.

O ator Thiago Carodso dando vida ao personagem

Considerado um dos autores mais importantes da literatura brasileira, Machado de Assis nos apresenta uma personagem intrigante como Capitu, com seus olhos oblíquos e dissimulados, menina tentação, transformando-a como uma das mais importantes personagens femininas da nossa literatura. 
A importância de eventos como esse é “formar de público para o teatro”, observa a diretora da escola Carla Yamashiro, na devolutiva para o ator quando ele conversava com o público após a apresentação. Apreciar os produtos culturais é uma forma de trazer conhecimento, reflexão e senso crítico ao que se busca para a formação dos alunos, além de trazer uma opção de lazer para a comunidade local. “Assistir ao espetáculo é ficar alguns minutos preso em um mundo imaginário se maravilhando.” – comentou uma aluna que prestigiou a peça.